Faz tempo que eu queria colocar no papel alguns questionamentos sobre a minha relação com a internet (quiça com o mundo), quem sabe eles também são os mesmos que os seus, por isso a leitura deste texto é altamente recomendável (fazendo meu próprio jabá).

Bom, vamos começar pelo começo: nesses tempos de internet podemos dizer que, somos {todos} narcisistas, cada um num grau diferente. Alguns são os extremos, outros ficam na média e, uma pequena parcela são os mais reservados.

Porém, é fato, se hoje eu ou você postamos uma foto no meu/no seu Instagram  ou escrevemos um texto (whatever) é por um único motivo: mostrar para, exibir para ou até mesmo, inspirar para o seu/nosso público de seguidores, seja lá qual for o motivo, a verdade é que não postamos por postar, postamos para nos verem, para saberem de nós, para nos admirarem intelectualmente, para o nosso prestígio, simples assim. Fato.

Diante dessa constatação, eu me questiono, o quanto dessa exibição visual/intelectual abre caminho pra sua falta de educação, de bom senso e agressividade na minha opinião ou na minha exibição?!

A postagem e A opinião…

Tudo anda meio raivoso no reino “das internet”, tudo precisa ser aprovado por um comitê contemporâneo e tudo precisa ser preciosamente perfeito. Não ouse titubear contra a maioria, ela pode ser implacável com o seu ponto de vista. Ela pode te acusar de tantas coisas…

Tanto é que, o elogio perdeu a sua verdadeira essência. Elogiamos como arma de barganha intelectual. Você me apoia e, eu, te cubro de elogios. Elogiamos com uma banalidade pessoas que nós não somos íntimas, em contrapartida somos ferozes e implacáveis com quem discordamos (e, não somos íntimas igualmente), afinal nossa relação raramente ultrapassa as linhas da escrita em posts e fotos.

Nada está bom para nenhum dos lados. Não reconhecemos esforços e nem pequenas mudanças com receptividade, queremos sair dos tempos “das trevas” para o do “paraíso perfeito”, sem fazer as adaptações necessária e sem nenhum ajuste. Aliás, como se isso fosse possível, não é mesmo?!.

Estamos polemizando tanto, mais tanto que, a sensação é de estarmos num looping infinito – aparece uma notícia, uma capa de revista, um texto, uma foto, um vídeo – pronto, vamos todos para a discussão, polemizamos, polemizamos…então, surge uma opinião diferente, dissonante da grande maioria, ela passa a ser atacada tão ferozmente quanto um marginal coagido por uma multidão ensandecida. E, assim ficamos horas, dias em cima de um fato. Indo e voltando como um bambolê bêbado.

Senhor, quanta energia desperdiçada, quanto tempo perdido em nossos próprios achismos, em nosso ego gigante que não para um segundo para ouvir o outro, quanta necessita de lacrar, necessidade de mostrar, exibir o quanto se é astuto ou influente perante um grupo.

Buscamos avanços nos posicionamentos sociais e buscamos um empoderamento feminino igualitário, mas literalmente o fazemos com o pé no peito DELAS, entre as nossas IGUAIS. A tolerância esta em extinção. Por isso, eu me pergunto…

Quando vamos sair desse looping?!

Lugar de fala virou a nova “it girl” do pedaço. Quer acabar com uma discussão?! use a expressão “lugar de fala” para calar seus oponentes (sim, estamos nos tratando como tais), afinal se eu não pertenço a um determinado grupo, eu tampouco tenho o direito em opinar.

Será?! falar sobre alguém ou algo, não significa falar em nome de alguém ou de algo. Partindo desta premissa, o seu ou o meu direito de “lugar de fala”, não pode limitar a liberdade de expressão de quem quer que seja. Um diálogo produtivo e inclusivo não pode se pautar por exceções, isso não quer dizer que pessoas que façam parte de minorias ou que, historicamente tiveram suas vozes caladas, neste momento não encontrem seu espaço de fala, o que difere da exclusividade de fala.

Para que eu não seja crucificada, pesquisei bastante antes sobre o termo e sobre o que alguns autores dizem à respeito dele. Um trecho de um texto chamado “As armadilhas do “lugar de fala” na política contemporânea, fala: Via de regra, o “lugar de fala” é quase sempre tomado como inscrito no corpo. 

O autor então, descreve o seu lugar de fala:

“Nesse sentido, o autor que vos fala é homem, branco, de classe média, para o que bastaria como etiqueta de um lugar de fala privilegiado, justificativa para ser reacionário. No entanto, também sou filho de pai que, no passado, foi bastante crítico ao regime militar e, junto com uma mãe que lecionava na rede pública, forneceu-me uma educação bastante crítica aos abusos de autoridade, ao individualismo consumista e às distinções sociais. Este também é meu “lugar de fala”, aspecto definitivo para moldar minha perspectiva de mundo, embora menos perceptível, menos inteligível e não inscrito no corpo. Experiências como essa não contam para a fórmula do “lugar de fala” atribuído por outrem .

Parafraseando o autor, eu também defino o meu “lugar de fala”.

“A autora deste texto é uma mulher branca, de classe social alta, isso bastaria para meu carimbo de mulher privilegiada e sem noção ao redor do mundo em que habita, ser carimbado na minha testa. No entanto, sou filha de um pai autoritário que, passou por privações, períodos de desemprego, vivenciei a dolorosa separação dos meus pais, optei em ficar do lado da minha mãe, segui o caminho de uma feminista revoltada e por vezes, agressiva. Na faculdade minha escolha foi social e, não financeira, entrar no curso de Ciências Sociais era a maneira de mudar o mundo e suas injustiças ao meu redor. Este também é meu “lugar de fala”, foi a partir dele, munida das ferramentas que eu possuía, eu moldei minha perspectiva de mundo, embora menos perceptível, menos inteligente e não inscrita no meu corpo. Minhas experiências, não são vivências de outrem, são minhas e pessoais.

É, nesse gancho que eu como estudante da filosofia da milenar Medicina Tradicional Chinesa, através do Coaching Holístico, enxergo a problematização estrutural do “lugar de fala”, ele passa justamente, pelo aspecto emocional das crenças e valores pessoais do indivíduo, as questões são levadas totalmente para o terreno pessoal e emocional, deixando de lado a visão política e social da questão tratada.

No texto da filosofo Marcia Tiburi, ela fala o seguinte:

“Não é possível falar do lugar de fala sem pressupor o diálogo enquanto reconhecimento do outro. Por isso é que se torna necessário separar o lugar de fala do lugar da dor. O lugar da dor é de cada um e em relação a ele só podemos ter escuta. Já o lugar de fala é o lugar democrático em relação ao qual precisamos de diálogo, sob pena de comprometer a luta“.

“Às vezes um lugar de fala pode ser um lugar de dor, às vezes um lugar de dor pode ser um lugar de fala. Se o lugar de fala é abstrato e silencia o outro onde deveria haver um diálogo, então ele já não é mais um lugar político, mas um lugar autoritário que destrói a política no sentido das relações humanas que visam o convívio e a melhoria das condições da vida em sociedade”.

Então, podemos concluir que, do que adianta vivermos na internet apontando o dedo o tempo todo?! pelo menos, do meu ponto vista político democrático, não vejo sentido em lutarmos separadas, sentirmos ódio alheio e rejeitarmos as opiniões dissonantes que não seguem a maioria, mas que se colocam de maneira respeitosa e aberta a aprender com o olhar do outro, com a luta do outro e, porque não, também, com a dor do outro.

Nenhuma dor é mensurável, nem tampouco a capacidade de amar das pessoas, por isso, mais amor e menos ódio. Eu não sou sua inimiga, apenas tenho as minhas vivências diferentes das suas. Eu não quero o seu mal, quero o seu bem. Não quero que a injustiça e o seu “lugar de fala” sejam menosprezados, quero que eles sejam a porta do diálogo e do enfrentamento de ideias e pensamentos, sem rancor e sem autoritarismo.

"Assim como não deve haver hierarquias de opressão 
não deve haver hirarquia de luta" Marcia Tiburi


		
		
			
			
		
	

**Todos os textos consultados para este post, estão na íntegra abaixo.

Lugar de fala e lugar de dor

As armadilhas do “lugar de fala” na política contemporânea

O “lugar de fala” ameaça a liberdade de expressão?

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